terça-feira, 7 de maio de 2013

A Morte

         A sete palmos. Era assim que iria estar em fração de segundos. O cano da arma era frio, mesmo sendo pressionado em sua testa. Aquilo o incomodava, definitivamente. E mesmo o homem que estava prestes a pressionar o gatilho estar em um estado deplorável de desespero, tremendo horrendamente, suando e quase chorando, ele sabia que não teria escapatória. Não dessa vez.
        Tudo começou com uma dívida. Drogas. Entenda, ser um dos traficantes mais poderosos da cidade não é pra qualquer um. Agora, como acabou ficando a mercê de um dos monstros que havia criado, um viciado - ou "noiado", como ele mesmo os apelidava -,  disso não fazia ideia. Cobrar alguém que vive em função de um pó ou de uma agulhada no braço nunca lhe pareceu uma tarefa difícil.
        Com toda a calma que podia transparecer, perguntou ao homem que iria matá-lo se acaso podia fumar um cigarro antes de morrer. Foda-se, já havia se cansado de tudo aquilo mesmo. Queria só relaxar, e uma bela tragada sempre o relaxava. Mas somente de cigarro. Sua política era nunca usar umas daquelas merdas que vendia. Eram somente sua fonte de lucro, já viu o suficiente da decadência para saber que não podia viciar em nada que vinha de sua fonte de lucro. Portanto, o doce do tabaco e alguns copos de whisky sempre bastavam.
        O "noiado" gritava, negando o pedido. Oh droga, porque eles sempre tinham que ser tão escandalosos? Que acabasse com aquela palhaçada logo. De repente, em meio ao total desdém que sentia da situação, avistou uma enorme sombra atrás de seu algoz. Arrepiou-se inteiro. A sombra se tornava cada vez mais nítida, conforme se aproximava prostrando-se ao lado do drogado com a arma apontada, que nada percebia. Possuia um enorme manto preto, cujo rosto nunca era visto. Ele sorriu. Finalmente ela havia chegado. Então, seria agora ou não...? Foi com enorme surpresa que viu o homem em estado deplorável que o ameaçara desde então mudar o foco da arma e apontá-la para a própria cabeça. Apertou o gatilho, sem lhe dar tempo de sequer esboçar uma reação.
         O que ouviu depois foi uma risada doce de mulher. A enorme figura negra começava a desaparecer. Não iria pro inferno, ainda não.
        A Morte o poupara mais uma vez.

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